terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Piriá, descanse em paz

Com tristeza que recebemos a notícia da passagem do Piriá, dono de um dos melhores botecos que Juiz de Fora já teve. Só nos resta guardar as boas lembranças e desejar conforto a família. Tomemos um gole em homenagem ao querido Piriá.


A foto é do blog do Studium Punctum

Em dezembro do ano passado escrevi aqui um texto sobre o Bar do Piriá, um dos primeiros do Botecos JF. Relembre:


Vá ao Piriá, mas se ele não estiver...

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Caminho da Roça - por que Natal é na mesa do boteco

 

Eis que meu amigo e parceiro de samba Carlos Fernando me manda uma mensagem: "sambinha informal no Caminho da Roça!". É a senha, o código secreto.

Havia algum tempo que eu não ia ao Caminho da Roça. Na última vez, o bar ocupava a metade do espaço de hoje. Como já tinha freguesia fiel, era necessário se apertar para poder tomar umas cervejas e comer o torresmo da casa. Torresmo esse - diga-se de passagem - é um dos melhores da terra, e compete de igual para igual com qualquer um da Princesa de Minas.

Retorno ao Caminho da Roça, mais amplo, porém ainda acolhedor e mantendo a lógica do bom boteco: cerveja gelada de preço honesto, torresmo de barriga saindo a toda hora, batata e salsicha em conserva, logo ali no balcão, decoração eclética com rádios antigos, garrafa de pata de vaca e mais um monte de coisas penduradas pelas paredes que por si só não fariam sentido, mas que compondo o ambiente parecem perfeitas. O Léo, dono do bar, incorpora essa função com zelo e categoria. Passeia entre as mesas, serve com presteza, toma uma cervejinha para aliviar o calor, decora rapidamente teu nome tua cerveja predileta.

O samba começaria as 16 horas.Aos poucos a rapaziada vai se acomodando e formando uma grande mesa, com muita cerveja, cachaça e torresmo. Eu, para acariciar o estômago peço uma jurubeba - santo remédio - diga-se de passagem.Carlos Fernando - esse filho da Vilsa Isabel - não deixa barato e entoa sambas de Noel, Martinho e Luis Carlos da Vila. No primeiro de Cartola, eu brinco: "Vila 3, Mangueira 1".
Carlos e seu inseparável pandeiro, ao lado do violonista e torcedor do Náutico, Alexandre.

Aos poucos o bar está lotado, mesas e calçada ocupada. As pessoas que saem do trabalho olham para dentro do bar com sorrisos estampados no rosto. Alguns param e ficam por ali para participar da Santa Ceia.

O coral se forma para cantar sambas de ontem e hoje, exorcizar o ano que passou e dar boas vindas ao que chegará, na esperança da canção, de que será no mínimo melhor. E assim, a tarde dá lugar a noite, e nós celebramos a felicidade real, em uma espécie de festa que faz muito mais sentido do que qualquer formalidade que o final de ano poderia trazer.



O Caminho da Roça fica na Rua Espírito Santo, 738, no centro de Juiz de Fora.

Conheça aqui (www.carlosfernandocunha.com.br) o trabalho do Carlos.

domingo, 30 de outubro de 2011

Bar do Totonho – da Série “Por Bares Nunca Dantes Navegados”

O Caminho

Como não soubéssemos aonde ir, no almoço de domingo, ficamos em silêncio tentando lembrar algum lugar a que não íamos há muito tempo. Porém de nada adiantou, e achamos por bem sairmos de carro para resolver o itinerário enquanto o próprio caminho nos induzia. Não demorou muito, no primeiro desvio, demos a volta e partimos para o Retiro.

De estômago nas costas, seguimos pela Avenida Brasil até a estrada União Indústria. Chegando à rotatória, que fica logo após a cumeeira da estação da Usina de Marmelos, contornamos o canteiro central, meia-parada, confere, não vem ninguém, entramos à esquerda. Passamos pela ponte sobre o rio Paraibuna, rodamos um bocadinho até o túnel antigo da estrada de ferro, passamos sob ela, e entramos na primeira direita. Transpusemos o córrego; logo à frente, seguimos a cerca-viva margeando a estradinha, e fomos à Rua Aladim Silva, 62. À esquerda, de quem chega, vê-se a escadaria, e ao pé desta um oratório de cimento. À direita, finalmente, o Bar do Totonho! (Para manobrar o carro, quem vai ao final da rua, observa uns dormentes fincados no chão de terra que separam os limites da rua asfaltada com a travessa curta que leva ao túnel pelo qual acabamos de passar e fecha o quarteirão).

Apesar das curvas, do trânsito pesado, da pedreira Santa Mônica, da natureza asfixiante e do apito do trem, que passava senão no imaginário, dir-lhe-ia, que, de fato, o esforço da viagem ao Bar do Totonho, vale à pena quando a Brahma não é pequena.

Para maiores pormenores, 
dê uma olhadinha no mapa . 
Também assista ao vídeo do Festival Comida Di Buteco que acontece todo ano em Juiz de Fora. Zine Cultural: Bar do Totonho e salive o Rocambole de Torresmo

A Chegada

Carro estacionado, nos dirigimos até a porta de entrada do boteco. Mas não era um Bar, senhor cronista?! Sim! E continua sendo; é que para quem nunca foi ao Bar do Totonho, ao chegar, depara-se com uma entrada acima de qualquer suspeita. À primeira vista, trata-se de um boteco da melhor qualidade, tais como os clássicos e inexpugnáveis Pés-Sujos. E que muitas vezes impunemente sofrem achincalhes quando não passam de uma respeitável casa de família. Mas esta visão desaparece rapidamente. Basta uma esticadinha de pescoço que perante seus olhos o lugar se revela como é. Lá verificamos que não havia mesa vaga para duas pessoas. Para isso servem as reservas por telefone, antes de lá chegar; mas isso não era problema, nos acomodamos à mesa de ferro que fica perto do balcão; enquanto esperávamos, pedimos uma cerveja estupidamente gelada e um tira-gosto (mandioquinha com lingüiça). O Totonho, porém, ouvindo aquilo, sugeriu: vocês vão provar a ponta do torresmo, né? E deu uma piscadinha marota (confira, na foto abaixo, a apresentação do pitéu).


O Bar

O dia transcorria azuladamente ensolarado. Depois de um tempo instalados, e de termos passado pelo rito de inclusão ao clima e de o Totonho ter nos feito as honras, vagou-se a mesa na qual aboletar-no-íamos para, finalmente, bater aquele rango de domingo.

Já instalados, fomos logo fazendo o pedido. Costela de boi, por favor, e para acompanhamento, arroz branco, maionese, feijão tropeiro. Tudo devidamente regado à Coca-Cola (explico: a cerveja substancial foi toda sorvida nos momentos que antecederam a este) e também a duas Taruanas porque ninguém é de ferro (clique no alambique).

Muito bem, enquanto esperávamos trazerem a refeição, ficamos de butuca no que estava a nossa volta. Embevecidos pelo dia mágico e pela ambiência favorável, sacamos várias fotos do local.


















Destaco a lona que cobre a parte posterior da garagem e filtra a luz, banhando a tudo e a todos de uma aura misteriosamente... azul. 

 
Vale destacar que, para a viagem, leve consigo a abnegação dos faquires e a paciência dos resignados. Sem pressa sempre, e sem desespero, é o que deve ser. Haja vista que perder a cabeça à toa destempera o dia de qualquer um. E se você acha que o local é fora de mão, vai levantando as mãos para o céu e agradeça que nesse Wonderful World ainda existe lugar de verdade. 

fotos: Cintia Brugiolo & Kadu Mauad  


segunda-feira, 1 de agosto de 2011

São João Del Rei: botecos que honram a tradição mineira

Fotos: Cecília Malavoglia 



Caros amigos e amigas, último final de semana das férias merecia um passeio que unisse a vontade de descansar com a possibilidade de boa música, comida,  e é claro um espírito mineiro para acalentar a alma. Quem é das Gerais - ou simplesmente se apaixonou por essa terra -  sabe o que quero dizer.

O destino: São João del Rei.

Se de certa forma o objetivo central era ouvir Elza Soares acompanhada do Farofa Carioca, Jaques Morelenbaum e seu Cello Samba Trio e Jorge Ben, o passeio sempre se torna um bom pretexto para conhecer novos botecos, restaurantes e casas do tipo. O centro da cidade facilita o trânsito, aos poucos vão surgindo os estabelecimentos, misturados com a paisagem local, entre monumentos, praças, igrejas. A boemia se funde ao barroco, a cerveja gelada, um papo rococó. Perfeito para um boteco: infindáveis reflexões entre o pecado e a moral cristã, sem fim, ou sem ousar chegar a algum lugar que não seja a própria dúvida.

Nas idas e vindas por botecos e restaurantes, dois tira-gostos me ganharam, facilmente.Vamos por partes.

No simpático restaurante com clima de bar, chamado Dedo de Moça, serve-se um incrível acarajé mineiro. A receita segue a linha tradicional do acarajé baiano, trocando aparentemente, o tipo de feijão. 


Os acarajés vem em um tamanho pequeno, propícios para o tira gosto. Junto, quatro tipos de recheio: carne-seca, linguiça, requeijão e vinagrete com capim-santo, receita especial da casa. O prato é impecável. Talvez eu diria que o tamanho da porção poderia até ser maior. Mas a qualidade do prato supre qualquer coisa. Eu diria, meus queridos e queridas, que é impossível não deixar rolar mais de uma porção desse tesouro. O chope da Brahma é bem tirado e gelado. Um atendimento excelente. Mesas na varanda permitem que você passe uma bela tarde com os amigos, divagando, vivendo.

Já o Armazém Choperia, além da Antártica Original estalando, de um tutu de feijão de comer de joelhos, oferece aos fregueses um incrível bolinho de feijão tropeiro. A massa de feijão é leve e temperada, e dentro dos bolinhos, uma generosa quantidade de couve e bacon. Frito porém sequinho, devidamente crocante. Esse bolinho me fez ceder dentro de minha radical e tradicionalista visão sobre a comida mineira. A cidade é barroca mas esse tira-gosto é antropofágico, moderno. 

 
No Armazém pode-se praticar uma das mais consagradas modalidades olímpicas de botequim: beber numa mesa na calçada. O bolinho sai rápido e enquanto você o espera, pode bater um papo com um garçom santista, gente fina.

Caberia ainda destacar a deliciosa batata a parmegiana com camarão do Velho Chico e  a comida deliciosa do Villeiros.

Por ora, constatei que preciso voltar a cidade para repetir o feito e conhecer novas delícias. Ainda há muito que desbravar nessa terra. Lá, permito-me ser, não um inconfidente nas ruas, mas um confidente nas mesas de bar.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Samba e boteco

Separamos  belos momentos de alguns dos nossos mestres do samba alegrando o mundo com suas canções em botecos ou similares. Confira!

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Seu Lair e arte de nunca falhar

O boteco do Seu Lair não tinha nome. Na placa pendurada por sobre a porta, apenas sobrevivera ao tempo a propaganda da Cervejaria Americana - tendo o nome do estabelecimento se perdido ao vento e gotas de chuvas de mais de três décadas.

O boteco do Seu Lair também não tinha localização definida. Era em lugar nenhum. Ali não era o Bairro Fábrica, apesar da possibilidade de se ver a Rua Bernardo Mascarenhas. Não era o Bairro Democrata, mesmo que da calçada fosse possível avistar os bambuzais que ainda circundavam o bairro. Muito menos era no meu querido Mariano Procópio - morada dos justos - mesmo que as mesas de ferro, tremessem quando passava o trem. Mas era ali, muito perto disso tudo. Onde nasce o subúrbio da minha querida Princesa de Minas

O trem corta o trecho que separa esse lugar nenhum (foto: Anderson Batista Evangelista Lima. original aqui)

Seu Lair - ainda que a contragosto - cedeu nome ao local. Era um dos mais ágeis donos de boteco que já passaram pela terra. Trocava as bandejas da estufa com velocidade ímpar, sem perder de vista jamais os desejos de seus fregueses. O molho de moela baixava nível, recarregava-se com destreza. As tiras de torresmo rareavam, antes mesmo que sentíssemos o cheiro do óleo quente na cozinha, já estavam de volta. Os vidros de batata em conserva, os ovos cozidos e tingidos de rosa ou azul, as linguiças - que lá eram claramente denominadas de mineiras - nada faltava enquanto houvesse um bravio guerreiro de pé.

O balcão de madeira nobre, antigo e calejado pelo passar do tempo. Adquirido de segunda mão. Paredes azulejadas. Chão de ladrilhos hidráulicos. E ai de quem pedisse para ir ao banheiro. No boteco do Seu Lair, havia "mictório". 

Nos fundos abatia as galinhas, armazenava o sangue e promovia aos sábados um frango ao molho pardo. Incomparável.

O mundo girava, as fábricas se fechavam, o asfalto reinava, a poeira subia, as enchentes tomavam as canelas dos incautos, e Seu Lair permanecia sereno. Apenas franzia a testa quando se esforçava para ouvir as notícias no rádio, que ele insistia em generalizar sempre como as notícias da "Rádio Industrial".

O rádio, um pequeno mas belo Motoradio ficava pendurado no batente que dava acesso à cozinha. O batente era torto, mas torto de dar medo em engenheiro. A casa era uma das poucas que resistira a enchente de 1940, e nunca fora reformada. Era a Torre de Piza dos bebuns, manguaceiros, aventureiros e todo tipo de figura que ali pousava.

Seu Lair um dia - desses comuns onde ele ouvia a ronda policial na Rádio Industrial - morreu fritando torresmos. Sentiu-se mal, sentou na cadeira e nem para morrer fez estardalhaço. Virou cadáver ali, sentadinho, com o pano de parto no ombro.

O velório - pasmem, caros leitores -  foi no próprio boteco. Eu confesso que nunca havia presenciado esse louvor. mas velaram o bom homem ali, no centro da birosca. Todo povo de lugar nenhum, a conjunção daquelas três pérolas suburbanas que davam vida a entrada da zona norte da cidade, estiveram presentes, a fim de dar um último adeus ao bom homem. Nesse dia, a rua cheirava cachaça e óleo. Um cheiro forte de vida, mais forte que incenso ou defumador, comum em dias de morte.

Eu tomei minhas bagaceiras.

As pessoas pareciam felizes e resignadas pela missão cumprida de Seu Lair e prestavam reverências ao caixão.

E as estufas estavam cheias, impecáveis, como sempre.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Tradição, Fartura e o olho do dono: Pró Copão

Tradição é tradição - mas esse veja bem, caro leitor - essa não é uma virtude por si só. Tradição se constrói com glórias, feitos, relevância, e principalmente um certo amor contínuo por determinada causa. É assim no futebol, é assim nos botecos de uma cidade.

Provavelmente nenhum cidadão que perambulava pelo então proletário bairro Mariano Procópio, ao final da década de 1920,  imaginaria - pelo menos antes de beber e comer por ali -que o Bar Mariano Procópio Ltda. iria render décadas de história, e em 2011, poetas boêmios renderiam-lhe palavras, sem contar a clientela feliz, que mantém a casa cheia e suas mesas disputadas.

O Bar Mariano Procópio, como bar que se preza, acabou ganhando alcunha, no aumentativo pra reforçar a virtude do bar: virou Pró-Copão. Poderia dizer que merece o aumentativo, por que o cardápio de comida é grande, as porções são generosas - de verdade - a variedade de bebidas é surpreendentes, e para quem aprecia como eu, encontra-se uma carta de cachaças pra mineiro algum botar defeito, sempre atualizada e detalhada onde pode-se conhecer maiores detalhes das canas oferecidas.

A foto é do site Cardapios JF - no detalhe, algumas das cachaças oferecidas na casa

Tira-gosto de respeito, meus caros, preza pelo sabor. Enquanto muitos se arriscam em botinadas na sofisticação, o Pró-Copão oferece ingredientes tradicionais, porém de grande qualidade e principalmente em fartura, compondo belíssimas combinações. Seria redundante citar inúmeros pratos, mas cabe sempre exemplificar, com um dos meus prediletos, o Jabá do Jagunço, que traz numa pedra quente, uma combinação incrível de angu de moinho d'água, com queijo derretido, onde repousam deliciosas costelas, pedaços de lombo, linguiças finas ao bacon, molho e torresmo. É a celebração da fartura, com bom gosto e qualidade, sempre. O cardápio é sempre atualizado, ou seja, a casa sempre oferecerá novas opções, mas sempre dentro dessa lógica de fartura e qualidade.

 No detalhe: o Jabá do Jagunço. A foto é do site do Pró-Copão

Faz diferença nesse bar, algo que é notório entre bares e botecos de qualidade: a presença do dono. Para além da filosofia de que é "o olho do dono que engorda o gado", isso transparece para mim uma idéia clara que aquilo vai além de um negócio. O dono do bar está lá, ora servindo mesas, ora recepcionando clientes, e sempre preocupado com a qualidade do atendimento e dos serviços. Em tempos onde bares e botecos viraram "bons negócios" e "investidores" colocam grana e vão curtir em outras bandas, essa postura é sempre um alento.

Cresci no bairro Mariano Procópio, em meio aos campos de várzea que por ali perduraram mais tempo que em outras partes da cidade, ao som do trem que cruzava quase de hora em hora aquela terra, nas sombras das palmeiras e jabuticabeiras do parque do Museu Mariano Procópio, e o Pró-Copão estava lá. Curiosamente para nós era natural que depois que nos tornássemos adultos, cheios de responsabilidades e desafios, ele continuaria ali, recebendo gente cheia de fome e sede de coisas boas da vida.

E hoje voltar ao Mariano Procópio torna-se ainda mais saboroso, com uma parada no Pró-Copão.



Conheça mais sobre o bar, acessando o site http://www.procopao.com.br

sábado, 5 de março de 2011

Bar do Abílio

- Eu achei que fôssemos chegar e estaria passando um bom jogo da segunda divisão!

A frase é do meu camarada-irmão Giliard Gomes Tenório, também colunista deste blog, e foi dita logo quando chegamos e nos acomodamos no Bar do Abílio, nessa sexta-feira molhada que antecedeu as festividades de Momo na Juiz de Fora.


Para um incauto a frase pode parecer sem sentido, ou interpretada com objetividade desnecessário que induz ao erro. O que meu camarada queria ver era algo que o jornalista Flavio Gomes chama de "futebol de verdade". Jogadores que colocam literalmente toda esperança em forma de coração na ponta da chuteira e dão sangue, suor e lágrimas em nome de flâmulas tradicionais porém esquecidas, e na busca da defesa de suas agremiações e de suas vidas e sobrevivência, comem grama.

É isso que buscamos quando saímos por aí em busca dos mais tradicionais e fiéis botecos da cidade. Estabelecimentos que abrem suas portas com o único objetivo de servir bem, como sempre fizeram. Jogam simples, na maioria das vezes. Três ou quatro tira-gostos especiais, cerveja geladíssima e uma cachaça especial, quase sempre guardada com carinho, e colocada a disposição de quem aprecia a bagaceira.

E isso o Abílio faz, com categoria e autoridade.

Parece que havia em mim nessa sexta um comichão. Desde a hora que saí do trabalho só me vinha a cabeça uma vontade de abrir os trabalhos do carnaval no Bar do Abílio. Tudo bem, já havíamos combinado com os amigos uma ida ao sensacional Boi na Curva, prodigioso boteco já relatado aqui pelo amigo Airton Soares.

Mas se íamos ao nobre bovino só mais tarde, restava tempo de ir ao Abílio e pra lá fui, carregando meu camarada Giliard Tenório.

Sexta é dia de casa cheia no boteco instalado logo no início da rua Fonseca Hermes. Mesinhas improvisadas na calçada, muita gente em pé, curtindo suas cervejas. Lá dentro mesas ocupadas. A solução portanto é tomar no balcão. Aliás, fato curioso esse. O Bar do Abílio não tem balcão. São os freezers que formam o balcão. E logo ali por detrás do "balcão" o mestre ABílio, com seu fogão industrial faz as panelas cantarem. A especialidade da casa é um excepcional fígado acebolado, que pode ser acompanhado de jiló, de acordo com o gosto do freguês. A casa oferece tiras de torresmo, porções de linguiça mineira e um chouriço incrível de tempero ímpar. É o tira gosto de boteco em sua essência mais plena e completa.

Abílio concentrado em sua tarefa

A casa oferece as principais marcas de cerveja, sempre geladas. Tudo por lá é simples, porém feito com consistência, desde a comida até as acomodações, que não deixam nada a desejar a outros botecos da cidade, sem cair nos fru-frus afrescalhados que muitas vezes levam botecos a se tornarem insípidos estabelecimentos.

Como vocês sabem queridos amigos e amigas, eu sou da teoria de que boteco bom é aquele em que você pode ir sozinho e se sentir acompanhado. No Abílio é algo corriqueiro, bem lembrado pelo meu camarada Giliard, horas depois já no Boi da Curva. É fato comum vermos por lá, pessoas que vão sozinhas e se enturmam nas conversas de balcão, ou simplesmente curtem sua cerveja e tira-gosto sem se sentir solitárias. Na república do fígado com jiló não tem sexismo. Mesas só de mulheres, mesas de mulheres sozinhas, mulheres sozinhas no balcão, sempre em um ambiente de respeito e tranquilidade. Aliás, geralmente em botecos tradicionais, o respeito é algo cabal e nunca relativizado.

Bebemos algumas Brahmas, comemos um belo fígado acebolado com jiló, tergiversamos sobre a vida, sobre futebol, samba, trabalho. Afoguei o comichão em Brahma gelada, meus amigos e senti que meu carnaval já podia começar.

Pagamos a conta, e fomos ver o Bloco do Beco passar pelas ruas da cidade.

Ah, urge lembrar. Sobre o jogo de futebol que passva. Não era um jogo de segunda divisão. Mas prevaleceu o espírito guerreiro do pequeno Macaé que venceu o Vasco da Gama por 3 a 1 e coroou todas as nossas teorias de como o verdadeiro amor a vida e as causas, traduzidas numa mesa de boteco, são fundamentais para seguir em frente, feliz e forte.

terça-feira, 1 de março de 2011

Idas e vindas nos botecos da cidade

Juiz de Fora, a marginal iluminada abre caminho para as noites nos botecos


O ano era 2002. Ano-novo tinindo e trincando. Recém aprovado no vestibular de História, resolvi curtir então férias dignas de quem havia tirado dos ombros um peso razoável.

Sempre em minha companhia, amigos de infância, dos quais eu nunca me separei - ainda que em carinho e afeto - rodávamos todos butecos, biroscas, espeluncas, quebradas, de todos os tipos e gostos, sempre em busca da cerveja gelada, de preço honesto.

Posso dizer que nessas incursões pelos rincões da Princesa de Minas adquiri imenso carinho e apego pela vida boemia. Nos finais de tarde, com sol caindo e refletindo no Paraibuna, nas madrugadas cheias de surpresas, no amanhecer que demandava sempre a saideira. Geralmente essa, numa padaria, mas isso é outra história.

Quem busca o boteco, busca vida. Convívio pleno, interação,integração. A faceta mais viva da sociabilidade humana. E era isso que ousávamos buscar pelas ruas da cidade. Era comum terminarmos as noitadas na companhia das figuras mais ilustres que habitam a noite da cidade. Sambistas, bebuns, meretrizes, punguistas, amigos e amigas feitos por ali, a cada gole, a cada tira-gosto.


A praça da estação, antigo coração da cidade, ainda abriga a boemia


Eu e meu grande amigo, Dyogo Barros, com quem fui criado desde os 3 anos de idade gostávamos de iniciar nosso trajeto etílico no saudoso Bar do Macedo, que localizava-se na parte baixa da Rua São João. Macedo era um português, mau humorado, bravo, devoto de Nossa Senhora de Fátima e Salazarista até o talo. Nos divertíamos vendo a turma fazer raiva no Macedo, enquanto as geladas desciam como água.


De lá era comum irmos a um dos mais simpáticos e acolhedores botecos da cidade. O Bar da Sidnéia, localizado no Mercado Municipal da cidade. Pela posição estratégica, era ponto de encontro de toda uma rapaziada da Zona Leste da cidade que atravessava a ponte para curtir os sambas e pagodes desse lado, e claro, antes fazer um esquenta no louvado boteco em questão.

A cerveja sempre gelada descia em ritmo frenético, de lá pra cá. Muita movimentação, conversa, encontros e desencontros. Nunca era preciso marcar com ninguém. Era só chegar lá, e pronto, encontraria com todos camaradas das antigas.

Para espantar a fome, Sidnéia mandava bronca numa isca de peixe de alto nível, crocante, de preço honesto, que vendia como água (ou cerveja). Em caso de emergência, leia-se tomar uma cachaça, era só solicitar uma tira de torresmo, já pronta enfeitando a estufa.

O clima agradável era coroado pelo ambiente do mercado. Amplo, arejado, cheio de cores e cheiros.

A regra número 1 de nossas andanças era sempre emendar meia caixa, sem o compromisso cumprido, nada de deixar a batalha. E ao final da empreitada, que geralmente acabava por volta de onze da noite, promovíamos um estica no Bar do Vagner, na Francisco Bernadino, na companhia de figuras que não conhecíamos mas que faziam parte de nossos momentos por ali.

Alegres e tristes histórias que adentravam a madrugada, de trabalhadores brindando seus benditos finais de semana que chegavam, tristes homens calados que observavam tudo ao seu redor, por detrás de seus copos.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Mariano Procópio, terra de botecos



Os botecos do Mariano Procópio estão lá, no mínimo desde 1941, quando a Unidos de Mariano venceu o carnaval de Juiz de Fora, comandada por um dos maiores sambistas que o Brasil já ouviu, João Cardoso.

Em tempos que não existia a Avenida Brasil, e as ruas prodigiosas, como a Feliciano Pena, chamada de Rua Nova, e a Duarte de Abreu - conhecida como Rua do Rex por abrigar o cinema de mesmo nome - terminavam numa relva verde que beirava o Paraibuna límpido, onde se pescava e nadava.

Lá no Mariano viveram, e ainda vivem meus familiares queridos, os Andrade, e por consequencia lá eu cresci e vivi os grandes momentos da minha vida. E o Mariano sempre foi um lugar especial.
No Mariano aconteceram os primeiros amores, as brigas de bairro, os primeiros porres, a descoberta do significado da palavra amizade. Do mariano eu ia a pé a Santa Terezinha, assisitir treinos e jogos do Tupi F.C, quando este ainda jogava no glorisoso Estádio Sales de Oliveira.

Cercado de botecos das mais diversas categorias, circundados por casas noturnas a moda antiga, onde casais dançavam por toda madrugada, era e ainda é um ponto onde se cruzam as mais diversas figuras da fauna juizforana. Frequentadores de gafieiras, sambas, forrós, bailes funk, botecos, transitavam entre nós. Um clima de boemia com heterogeneidade ímpar nessa cidade.

Meu pai sempre dizia:

- É o Brooklin brasileiro! Onde tudo acontece!

A Rua Mariano Procópio tem uma jóia antiga e refinada, o Pró-Copão, um dos mais tradicionais bares da cidade e que sempre fez parte do cotidiano do bairro. Logo após o Museu havia o Bar do Cacá, um ambiente com pouco mais de 20 metros quadrados, onde a especialidade da casa sempre foi a cerveja mais barata do mercado, bem gelada, e a batata em conserva. Sim, apenas isso. Muitas vezes o pouco é muito. Ainda era possível comprar lá, uma cachaça de preço baixo, com nome genérico de "pinga da roça".

Na década de 1970 havia logo a frente um dos mais aclamados bares da história de Juiz de Fora, o Bigode do Vovô, de onde saía o bloco "As Bigodetes" que reunia homens vestidos de mulher e mulheres vestidas de homem. Até hoje essa turma se reune no final de ano para lembrar esse tempo maravilhoso.

Já na Rua do Rex, ainda presente nos dias de hoje, o Bar Cordial, sempre chamado de Bar do Ciro, nome de seu proprietário. O local ganhou oficialmente esse nome após a morte do Seu Ciro. Lá eu costumava ir nas manhãs de sábado com meu pai, em tempos idos, onde minha bebida ainda era a Coca-Cola. Aos domingos saía um pastel, de massa caseira. Nunca me esqueço das sábias palavras de Zé Pressão, caminhoneiro gente fina, sempre presente ali, quando alguém queria saber qual pastel era qual.

- Você faz o seguinte. O sem nada é de queijo, o que só tem batata é o de carne.

Obviamente uma brincadeira. O pastel era excelente. Mas a especialidade da casa era o Pão Molhado. Um pão francês embebido num molho incrível de moela. Tal iguaria de boteco era não só apreciada pelos boemios, como também por crianças, que nos anos 70 e 80 costumavam comprar e levar para a escola como merenda.

Botecos não faltavam. Nunca me esquecerei do Pedra 90, que tinha uma curiosa placa: "Pedra 9nta". E como não falar do "Olho Vivo", lugar apertado, com porta de molas, como aquelas de Saloon de filme de bang-bang. Lá dentro a música ao vivo rolava solta nas madrugadas.

O mais engraçado é que poucas vezes me sentei nesses lugares para beber cerveja. Eles fizeram parte da minha vida, do meu imaginário, talvez tenham contribuído para minha paixão pelos botecos. O Mariano sempre teve essa alma de boteco, onde passam todos tipos de pessoa, em busca de diversão, uma boa conversa

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

É o Boi

Por Airton Soares

Dizem que a cidade começou por aqueles lados. Deve ter sido mesmo, pois, além da primeira casa em construção de alvenaria (Fazenda da Tapera, na Alencar Tristão) e um clube de futebol de quase 100 anos (O querido Tupi Foot Ball Club), temos por lá os botecos mais antigos de Juiz de Fora.

Gaiola e Bar Dias tem mais de trinta anos. O Boi na Curva já passou dos quarenta. Com tanto tempo de estrada, certamente contam com bebidas e petiscos já provados e aprovados por diversas gerações.

Eu morei naquela região, ainda na infância, e, por acaso, quando casei e comprei meu apartamento, calhou de ser neste mesmo bairro. Já conhecia as ruas e vielas, mas não era habitué de nenhum bar daquela região.

Pelo mesmo acaso que me levou a voltar a morar por lá, eis que passeando pelas ruas do bairro encontro um bar sobre o qual sempre ouvi falar: O Boi na Curva.

(Adendo: Bares sempre tem nomes originais, e deste nome sempre gostei. Ainda mais quando vi que o bar não está numa curva. Mas nomes como “Chico Cara Feia”, “Gaiola”, “Futrica”, sempre instigaram minha imaginação.)

Localizado na Luiz Rocha, n.º 117, o buteco chama a atenção pelas mesas colocadas na calçada e pela loja principal, com um crânio e chifres de um boi de verdade pairando sobre o letreiro: Você verá centenas de garrafas de cachaça nas prateleiras, junto á parede. Disso eu gosto, e guardo esta como a principal característica de um boteco: Prateleiras abarrotadas de garrafas. Herança de tempos em que os fornecedores demoravam a aparecer para fazer as vendas, ou mesmo de tempos de inflação que justificassem a aquisição de maiores quantidades, evitando o iminente aumento de valores.

Lá estão elas. Algumas com seus rótulos deteriorados e amarelados. Duas delas, em especial, já tiveram lances que superam em muito seu valor: Um marimbondo, atrevido, fez sua casa entre a tampa e o gargalo. Impossível abrir e destruir o trabalho de tão nobre engenheiro. Pobre líquido desperdiçado, mas bela arte da natureza.

Mais recentemente, o bar passou a contar com mais uma prateleira, agora suspensa, que paira sobre o balcão. Lá estão mais uma centenas de garrafas de cervejas especiais, todas já abertas e saboreadas, creio eu. Parte do processo de aprendizagem do nosso querido proprietário, que aprendeu o ofício de cervejeiro. Mais adiante entro em detalhes sobre os resultados, vale a pena falar sobre.

Dentro do balcão, além dos sempre atenciosos funcionários, você notará uma série de panelões fumegantes. O aroma que delas surge enche o ar daquele espaço. São os apreciados caldos, prato chefe e especialidade da casa. Produzidos diariamente, sempre estarão fresquinhos, no que diz respeito a produção, mas serão servidos quentes, sempre, e por isso não se apresse, pois se não estiverem na temperatura adequada, eles não irão pra mesa antes dos funcionários “darem aquele calor” no caldo.

Chama a atenção, ainda, um belo galão de vidro, preenchido da famosa pinga com mel. Vende igual água, mas desce suave na garganta igual...igual... Pinga com mel mesmo. Vale à pena experimentar. Aliás, cachaças não faltam por lá. Diversas marcas, ao gosto do freguês. Descem bem, acompanhando os tradicionais caldos.

Voltemos, então, aos panelões e seus conteúdos. Você será servido em um prato branco, de louça. A “porção” de caldo tem preço na faixa de 6 a 7 reais. Serve bem, mas você pode repetir ou pedir “meia”, se achar necessário ou quiser provar outros tipos de caldos.

O principal leva o nome da casa: Boi na Curva! Não é vaca atolada, meu caro leitor: É mandioca triturada, adicionada de costela de boi desfiada, temperada com uma receita que só o proprietário e seu pai conhecem.

O Caldo de Feijão: Feijão batido e bem temperado, acompanhado de torresmo crocante, que estala quando você afoga o mesmo no caldo. Maravilha!

Inhame com lingüiça: Caldo de inhame, triturado, acompanhado de lingüiça bem temperada, fina e fatiada. A lingüiça insiste em afundar pro fundo do prato e você vai ficar entretido pescando a lingüiça e saboreando o delicioso caldo.

Canjiquinha com costelinha: Canjiquinha cozida e bem temperada, com grãos que dissolvem na boca, acompanhada de costelinha de porco. O curioso deste prato é que a costelinha é preparada em separado da canjiquinha, senão iria se desfazer no cozimento. Na hora de preparar o prato, o cheff pesca uma generosa porção de costelinha na panela de pressão, e adiciona a canjiquinha sobre a mesma.

Rabada com Batata: Meu preferido. Batatas cozidas com rabo de boi. Ah, meu caro leitor, não se assuste se nunca tiver comido esta parte do boi! È simplesmente delicioso. Carne macia, com fibras longas que se desprendem do osso facilmente, e dissolvem na boca, quase poupam o trabalho de mastigar, tamanha a suculência desta nobre iguaria.

As batatas quase somem durante o cozimento, e incorporam o sabor da carne e os temperos, sempre secretos, do Cheff.

Mas, sabe-se lá Deus o motivo, há daqueles que não gostam de caldo. Misericórdia!

Não há nada melhor pra forrar o estômago, antes de engatar numa boa bebedeira, ou mesmo depois, pra matar aquela fome que surge depois de secar algumas ampolas de cerveja.

E ora, pois, se você não quer caldos, vá lá assim mesmo, e prove a cerveja artesanal produzida pelo mestre cervejeiro Cristian Rocha. A cerveja Profana já foi agraciada por vários títulos estaduais e nacionais!

Sempre gelada, é servida em copos apropriados e com a logo da Profana, e isso já é bem legal. Na tulipa de Weiss cabe uma garrafa inteira *.*

Para um ogro glutão, como eu, é a redenção.

A cerveja é saborosa e encorpada, feita com produtos de primeira. O Cristian, cara de sorte e, principalmente, muito dedicado, ganhou uma fábrica de cerveja como prêmio num destes títulos de suas cervejas. Coisa linda, mas creio que não esteja aberta à visitação, ainda.

Weiss, Bock, Indian, Red, Ale, Pilsen, Stout… Tudo isso ele fez ou faz. Sempre há alguma dessas por lá, e todas valem a pena.


Bem. Tanta conversa me deu fome e uma sede por cerveja de verdade. Vou terminar este texto logo e correr (não literalmente) para o Boi na Curva, que, como disse, fica numa reta e leva este nome em referência a uma tradição que diz que, antigamente, no interior de MG, sempre que um boi era atropelado por um trem, nas curvas da estrada de ferro, isso significava fartura de carne para os moradores de lá. Afinal, ninguém come um boi sozinho, não é verdade?

Quer chegar lá? Siga a Avenida Rui Barbosa, passando pela praça, pouco mais de 100 metros à frente, vire à esquerda: É a Rua Luiz Rocha. Siga por mais 100 metros e o Boi estará lá, á sua esquerda.

Site: http://boinacurva.com.br/

Site: http://www.cervejaprofana.com.br/

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Com vocês, Cold Bar.


Na contramão dos botecos raiz, famosos, conceituados e blá, blá existe o Cold Bar.

Amigos, o Cold Bar não deve ter nem dois anos de existência e sua casa, bem espaçosa, porém de um calor senegalês – embora, eu confesso, nunca tenha ido ao Senegal - antes abrigava o Joker bar, para uns o saudoso, para mim, indiferente.

Américo, feliz proprietário da casa, pode se gabar de uma clientela seleta e diversificada, são senhores moradores da Rua São Mateus, pertinho do antigo Salamaleque, hoje algo do gênero, perdidos, do bairro São Mateus, amantes de futebol, como eu, do bairro São Mateus e jovens de preto. De eles vêm eu não sei, mas creio caso sejam do bairro São Mateus não andam de coturno, maquiagem e cabelos espetados, talvez só saiam quando o movimento black rock acontece, vai saber.

Eu sei, já expressei toda a minha afetividade em bares que passam o glorioso e foi no Cold Bar que encontrei meu refúgio silencioso. Os senhores, aqui já citados, provenientes da rua e do bairro todos se estabelecem durante as partidas, carinhosamente chamados pelo nome do time. Eu, por exemplo, sou o botafoguense, (jura?), ainda sobram flamenguistas, tricolores e até extintos vascaínos de idade avançada. Comentam-se os jogos, relembram jogos e são dotados de uma memória ímpar.

Outro ponto divertido é a fácil e contínua acessibilidade a minha cerveja predileta: Heineken, poucas as vezes que lá não contava com a garrafa verde e seu precioso sabor. Com o tempo você tem-se a liberdade de abrir o freezer, pegar uma gelada e gritar ao Américo: “peguei mais uma!”. O torresmo e o feijão amigo, fazem parte de um extenso cardápio que vem acompanhado de uma nota interessante: “Couvert R$3,00 ou negociável”. Aí minha imaginação entra em um estágio inevitável de montar debates com o proprietário sobre o desconto: “Não faz por R$1,50? Quando eu cheguei o som estava na metade”. Ainda não pude ver tal debate, mas pretendo até interceder caso haja.

Foto: Revista Pauta Econômica

Futebol, impessoalidade amistosa, cardápio vasto, couvert negociável, tudo isso o Cold Bar tem a oferecer aos felizes moradores de São mateus e entorno. Vos digo, por experiência, levei amigos que de primeira torceram o nariz para bar e depois ficaram maravilhados pelo atendimento, cardápio e toda ladainha que já citei. Essa semana tem jogo, você pode me encontrar lá!

sábado, 15 de janeiro de 2011

Pontos de doação para as vítimas da tragédia no Rio

Interrompemos nossa programação de boteco por uma boa causa. Quem puder ajudar, envie sua doação para as vítimas da chuva na região serrana do Rio:


Clube Bom Pastor, parceria com a OAB. Rua Senador Salgado Filho, 313 - Bom Pastor

Sindicato dos Bancários, na Rua Batista de Oliveira, 675

MixAlternativo, localizada na Rua Oscar Vidal 150/302, também recolhe doações, a idéia é enviar na segunda as doações

Colégio Apogeu, na Rua Santo Antonio, próxima a esquina da Benjamin. Na quarta começam a enviar!

No Supermercado Bahamas também é possível fazer doações. Voluntários se encontram nas lojas espalhadas pela cidade

Quem mora em Juiz de fora e quer fazer doações p/ vítimas das chuvas no Rio, Rodoviário Camilo dos Santos busca na sua casa. 2102-8000

A Catedral faz a 'Campanha SOS'. Doações na paróquia da Igreja, de segunda a sábado, das 7h às 22h, domingos, das 7h às 13h 15h às 21h.

Igreja Matriz do bairro Santa Luzia, que fica na Rua Ingracia Pinheiro, nº 170. O telefone é o (32) 3234-3332

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Baalbek, sob as bençãos do profeta

Descendo o calçadão da rua Halfeld, na primeira galeria a direita entre. Já dentro dela, vire a direita. Ali é o alardeado "Beco do Baltazar", cantado em samba memorável de Armando Aguiar Mamão. Também conhecido como "Galeria da Mineira", apelido da época que a mesma não tinha saída e culminava na sede da companhia Mineira de energia, tempos que a Cemig ainda não existia.

Tal lugar sempre conhecido pelo Bar do Beco que deu origem ao mais tradicional bloco carnavalesco da cidade, o Bloco do Beco.

Mas meu encanto por esse lugar sempre se deu pela casa de comida árabe ali localizada. O Baalbek tornou-se um grande boteco de Juiz de Fora, sem perder em nenhum momento a qualidade de suas cozinha árabe. Eu diria que ali está a melhor esfiha da cidade e sem dúvida o melhor kibe com labne que ja saboreei na vida.

Cabe salientar que Juiz de Fora é a segunda colônia sírio-libanesa do Brasil. Sendo assim a tradição da comida árabe nesta cidade é forte, graças a Alah, sob as graças de Mohamed.


A galeria cheia de bares, com luz baixa, dá o clima da boemia, tornando o local ainda mais charmoso. No verão a possibilidade de escapar do sol quente, princpalmente aos sábados quando mantemos aquele hábito de descer o calçadão seja pra olhar vitrines, seja pra dar pinta e encontrar conhecidos na mais famosa rua da cidade. No inverno, a possibilidade de escapar do frio. Ponto de encontro das pessoas que usam também os sábados para as lutas políticas, sejam sindicais, populares e sindicais.

Em tempos memoráveis o Baalbek oferecia o chope da Brahma gelado e bem tirado. O grande movimento possibilitava a alta rotatividade, que garantia um chope fresco e gelado. Se não mais há chope, continua havendo lá uma das cervejas mais geladas da face da terra.

No santo sábado, dia santo sim, no calendário do frequentador de boteco, a casa oferece uma iguaria. Um belo pernil assado, que pode ser degustado em forma de porção, bem acebolado, ou simplesmente o sanduíche de pernil, preferência de vosso interlocutor. Tal sanduíche ganha trejeitos sublimes quando regado com o molho de tahine, preparado ali mesmo na casa.

Como todo boteco que se preze, o Baalbek tem seus frequentadores assíduos que soam como personagens, que sem os mesmos, o bar perderia o charme. É um lugar onde facilmente pode-se ir sozinho e ter com quem conversar. Muitas vezes lá estive, no final das tardes de sexta, e ganhei bons minutos da vida, conversando ali mesmo, no balcão com as figuras carimbadas que ali estão.


Com a turma reunida, independente da casa cheia, sempre arruma-se espaço. Uma mesa aparece, uma cadeira é resgatada e em poucos minutos todos estão sentados e prontos pra desfrutar da casa.

Apesar de estar localizado numa galeria, o trânsito de pessoas é intenso, e é sempre possível cruzar ali com os conhecidos, puxar mais uma cadeira e esticar o papo.

O Baalbek é portanto, um oásis de calmaria e tranquilidade, pra quem passa correndo no coração da cidade de Juiz de Fora, espremendo tempo. Lá é sempre possível fazer o tempo durar mais um pouco, até a saideira.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Botecagem de verdade tem que ter direito a Replay

Como butequeiro sul-mineiro radicado em Juiz de Fora, confesso antecipadamente que venho fugindo às raízes. Vá lá, em tempo de vacas gordas, eu bem ando freqüentando uns bares assim um cadim mais sofisticados. Sou exemplo do que diz o bom e velho presidente Lula: o povo gosta do bom e do melhor (quem gosta de miséria é intelectual). Apesar disso, quem já se deu ao direito do desregramento que a vida boêmia exige sabe que estes conceitos de qualidade variam significativamente. Vai do gosto do freguês, diz o ditado. Mas ah!, dessa vida de Alto dos Passos e eticétera e tal, que saudade que me dá daquela butecagem mais autêntica, ou mesmo mais honesta, ouso dizer. Ah!, se não troco os requintes gastronômicos por aquele pacotinho de amendoim torrado do vendedor delivery de bar em bar, e as delicadas taças de cervejas – apropriadas para cada um dos tipos desta – pelos tradicionais copos americanos, levemente lascados e arranhados...

Se o buteco é uma espécie de casa que adotamos, apresento à queridagem que agora lê estas linhas meu refúgio juizforano: o Replay Bar. Estrategicamente localizado a dois quarteirões de minha residência (o que oferece uma bela solução logística para os casos advindos das dificuldades proporcionadas pelas experimentações etílicas), o Replay vem me servindo de dois modos. Primeiro, como arquibancada para as solitárias noites de torcida pelo Mengão do meu coração. Em segundo lugar, como porto seguro para as últimas horas das noites de boemia. E é neste quesito que o estabelecimento se destaca. Nos derradeiros instantes antes de a madrugada fazer-se dia, importa que a cerveja esteja gelada, que os quitutes ainda embacem as estufas de vidro, que a calçada comporte mais uma mesa e que restem fichas para o karaokê.

O Replay nunca falhou comigo e com meus chapas em nenhum destes quesitos – e nunca o fará! Tenha a certeza, nobre leitora, nobre leitor, trata-se de uma relação de confiança, ancorada no que há de mais religioso na tradição boêmia. A começar pela cozinha, simples sim, mas, coisa mineira, farta e saborosa. Que se lembre aqui do mexidão – o tradicional, que fiquem bem claro! –, tão caro aos madrugadores da Princezinha de Minas, e menção honrosa ao fígado acebolado, para os carnívoros de plantão.

A questão etílica, razão de ser deste depoimento e do blog que o comporta, vai bem representada. A honestidade dos empreendimentos deste tipo expressa-se já no preço da cerveja, o qual é bem apropriado aos últimos trocados que restaram da noite que se iniciara tantas horas antes. E como o alcoolizar-se se torna muito mais nobre quando feito coletivamente, o público do Replay, de cativo, faz-se cativante. Democrático, antes de tudo, em etnia, religião, nível educacional, mas sobretudo em gostos e talentos musicais. As urnas, símbolo da democracia nas eleições, é aqui substituída pelo karaokê. Canta quem quer o que bem entender, cujo esforço é valorizado por todos os presentes. “Um amor que não cabe em si”, diria Djavan, sendo bastante exato.

Aos pés da alterosa serra que a Avenida dos Andradas inaugura, o Replay destaca-se por levar com simplicidade e de um modo todo seu o bem-viver da boemia. Assim, após ser expulso de um destes bares que fecham cedo, não tenha dúvidas, queridagem, o Replay estará de braços abertos para o tradicional estica.

Bar do Chinelato

por Eduardo Freitas, o Preá


A sobriedade plena me impediria de dizer todos os elementos de um local tão sóbrio quanto o boteco em questão.

O Bar do Chinelato carrega consigo muita mais história do que o autor da narrativa conhece e pode construir. Muitos de seus frequentadores poderão e legitimamente nutrirão a raiva mais plena por ausência de fatos construtores de sua identidade ou ainda por não ver em meu relato seus nomes, tão conhecidos, lembrados por aqui.

Minha relação com o toldo verde e suas toalhas de cantina italiana foi um acaso do caso. Caso construído em busca de um aperitivo de botequim barato.

Quando se é estudante o barato jamais sai caro. O aniversário de Roberto era o tema, e o dia ficaria marcado como a ocasião de quebra de condutas. Gritos, palavrões, o individualismo de sua própria mesa e o garçom para si mesmo. Costumes de meninões nem tão novos com seus vinte dois anos, onde tudo era permitido.

Permissões ali negadas. severa e enfaticamente.

Ali não era lugar de palavrões, meu jovem! Muito menos de não-audição do dedilhar de um violão! Ali não!

O que vale valia, e vale naquele lugar: um olhar, atenção e um aperto de mão. de domingo a domingo passei a nutrir ali meu início de semana. Esperava cada um em sua mesa, cada um em seu horário, como a mais rígida disciplina familiar.

E ali estava, entre os meus. Jamais apresentado mas na certeza de que eles eram eles. Esperava ansioso o chegar do violão. Chegava mas não saía do carro antes de duas ou três cervejas.

Despretensiosamente então vinha, junto ao aroma do frango do outro lado da rua.
Do colo do poeta fazia melodia junto aos meus. Alegrava meu domingo. Por anos, por semanas, por dias, fazia a diferença. E eis algo que o tal do boteco tem que ter: diferença.

Lá ela residia de maneira substantiva.

Os donos, pais de um intercâmbio sóbrio. Acolhedores que memorizam seu nome (ou alcunha estranha) na segunda cerveja, recebem assim, dadas as regras, seguidas sem nenhuma coerção.

Fígado, língua, feijão amigo, batata emolduram o cenário de dias agradáveis.

Cerveja gelada, incluindo Itaipava, rebelde no cenário ambeviano. Um bar, ao menos no domingo, com hora para abrir e fechar. Um bar sério. Assim como a tradição exige seus ritos rígidos.

A narração do Bar do Chinelato pode parecer um pouco poética demais, e assim deve ser! O desafio está lançado: leia novamente esse texto depois de passar por lá em um domingo, às 11.30 da manhã e permanecer por ali até as 15.00h

E tenho dito.


(o Bar do Chinelato fica na Av. Presidente Costa e Silva, esquina com a Rua Herman Toledo – São Pedro)

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Santa Comunhão – Bar do Bigode & Xororó

Em atenção, e deveras feliz por aceitar o convite, inauguro uma crônica no Botecos JF. Mas não poderia escrevê-la sem antes agradecer ao colega & amigo, Tiago Rattes, de ter me concedido a honra em colaborar no recém-nascido blog sobre as “tabernas & boutiques” da Princesazinha de Minas, GizdeFora. É com todo prazer que atenderemos de bate-pronto esta sua mais nobilíssima empresa. Será um júbilo, cumpade! Vida longa ao blog etílico, Botecos JF!

***

fonte: http://papahostias.blogspot.com/

Há muito afastado da vida boêmia me vi na obrigação de fazer uma visita a um dos bares mais famigerados da cidade, o Bigode & Xororó. Sua fama se deve justamente ao fato de eles terem desenvolvido alta tecnologia no preparo sistemático do quitute que acabou por se tornar a galinha dos ovos de ouro: nada mais nada menos do que o Torresmo do Bigode. Servido nos formatos “tira & ponta”, ou no tradicional à pururuca, aquele do crac-crac na dentadura, tem por companhia um meio limão; o trio auriverde pode vir acompanhado pelo refresco que lhe agrade. Expostos na vitrina do balcão frontal, o esfomeado poderá, a seu bel-prazer, dedurar qual das três qualidades que ele deseja tira-gostar junto à loura que escolher (cerveja? Temos 7. Cachaça? 70 vezes 7. ). Escolha feita, sapecam-lhe a indefectível pergunta: – Pica pra um?

Composto de três sedimentos, crosta, banha e carne, o torresmo do Bigode & Xororó é tão indescritível na sua apresentação visual quanto no sabor e na crocância que inebria o paladar do energúmeno. Qualquer alfabeto ou interjeição seria insuficiente para expressar o que significa experimentá-lo, seja com os olhos, seja com a língua. Seu aspecto e espectro são ambos um todo indissociável. A mistura do azedo com o salgado deixa no paladar aquele adstringente que dá uma sensação de frescor nas papilas gustativas e uma sede do camelo mais sequioso.

A filosofia do Bar do Bigode segue o dogma da abençoada e ingênua malícia de todo santo dia – Para levar a vida numa boa é que deve ser. Típico de lá é o método de servir a cerveja joão-bobo. O cliente feliz e salivante ao ver a suada ali, em cima da mesa, na expectativa de sorvê-la, pode tomar um susto com a prestidigitação mandrakeana.

Numa dessas já escutei por lá que, nos primórdios da bodega – quando o Xororó era pequeno... digo, usava fraldas e ainda nem sonhava em ser sócio do João, hermano de DNA do Bigode – que a tábua, onde é fatiada a iguaria, foi comprada de um caixeiro viajante cuja indumentária denunciava sua bíblica procedência. Segundo os donos do Bar, o vendedor (de sandálias, túnica, turbante, barba e o Corão no sovaco) jurou de pés juntos que aquela madeira milenar seria um pedaço original da mesa que estava na Santa Ceia. Pitoresco, não?

Seu cardápio esbanja não só economia no tamanho como também apresenta um extenso rol de tira-gostos variados tanto em espécie monetária quanto na qualidade dos acepipes, que são sempre muito bem-vindos para se mordiscar enquanto se sorve uma cerva pra lá de gelada. Mas com perdão dos racionalistas ou daqueles que se deixam enganar, o torresmo do Bigode já passou de melhor do que. É comida consagrada, em Santa Comunhão, a que muitos são chamados e poucos serão os escolhidos.